quarta-feira, novembro 29, 2006

Catástrofe

Como tinha prometido ontem, passo a descrever como foi o meu primeiro simulacro de catástrofe (e espero futuramente não passar disto, ou seja, de um simulacro apenas...):

Foi simulada uma queda de avião inglês com cerca de uma centena de feridos, com intuito principal de testar os planos de evacuação pré-hospitalar numa situação de catástrofe, testando as capacidades das diversas forças operacionais e de intervenção, quer civis quer militares, mas também (e já agora, e porque não?) a actuação intra-hospitalar neste tipo de emergência.
(e aqui lanço uma interrogação: onde está o o plano de actuação intra-hospitalar numa situação de catástrofe?? Sinceramente, nunca o vi....)

Muito sumariamente:
Ás 10h20m ligaram para o hospital e deram o alarme de situação catástrofe -uma queda de uma avião com 149 feridos (caso a memória não falhe).
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Enquanto paralelamente decorria o pré-hospitalar (e com os olhares populares curiosos a atrapalhar como se tratasse de uma situação real), houve uma evacuação imediata dos doentes 'reais' da urgência do hospital para outros locais/pisos do edifício, de maneira a ter espaço(s) apropriado(s) à recepção de doentes feridos em larga escala. Os que saíram ilesos, foram levados para locais de acolhimento, onde receberam apoio psicológico.
Accionaram-se meios, cortou-se as chamadas de carácter não emergente para o hospital, mobilizou-se pessoal de saúde, equipou-se esses locais com equipamento adequado, registaram-se os tempos de actuação.
Alertas na rádio para a população que necessitasse de cuidados de saúde se dirigir aos centros de saúde da zona, que excepcionalmente, se encontrariam abertos até mais tarde.
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Cronometrou-se e esperou-se. Todos nós vivíamos cada segundo que passava como se fosse o último. O relógio não parava e havia mil e uma coisas a preparar antes da chegada dos 'feridos'. Faltava sempre alguma coisa, um pormenor que ficara esquecido com os planos de emergência no fundo de uma gaveta...
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Finalmente chegavam os feridos em bolús.
Os feridos mais graves (que contrariamente o esperado numa situação de catástrofe foram os primeiros a chegar...) foram transportados de helicóptero para o aeroporto e depois, de ambulância para o hospital, antecedidos por equipas de batedores da polícia e sirenes estridentes.
Os jornalistas, os representantes das embaixadas estrangeiras e os curiosos colocaram-se estrategicamente à entrada do hospital (do lado de fora). E o gabinete de triagem também (do lado de dentro).
A triagem secundária, executada num ápice, visava apenas a probabilidade de sobrevivência, e não a gravidade da situação como rotineiramente ocorre (pois é, aqui não interessava se se tratava de uma grávida, idoso, adulto ou criança!! A probabilidade de sobrevida era o único factor a considerar...).
Os doentes triados a vermelho e amarelo foram rapidamente conduzidos às respectivas salas, onde uma equipa de médicos e enfermeiros pré-designados os aguardavam. Ninguém saía do seu perímetro de actuação.
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Fiquei colocada nos amarelos, onde pude dar (e colaborar na) assistência a alguns 'doentes', maioritariamente de carácter ortopédico-cirúrgico, o mais grave dos quais um T.V.M. -traumatismo vertebro-medular.
Interrogatório breve e capacidade de síntese (o crónometro não parava). Os 'feridos' vinham de maca, 'ensanguentados', com o vestuário rasgado e com um texto bem ensaiado pronto a debitar... Como se tudo fosse real...
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O kit de triagem trazia já folhas de imagiologia, patologia clínica (hemograma, bioquímica), imunohemoterapia e tubos de colheita. (Obviamente as colheitas foram simuladas e amostras vazias enviadas ao laboratório; o mesmo ocorreu na imagiologia).
Não havia tempo a perder... Registaram-se os tempos.
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Até que, ás 16htal, o período de crise foi dado por terminado...
Uff, respirou-se de alívio.
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Foi sem dúvida um bom ensaio, pensado ao milímetro (pronto, ao centímetro.) Senti-me satisfeita por poder participar num simulacro 'tão real' de uma possível situação de catástrofe, situações-tão-raras-mas-que- podem-acontecer-a- qualquer-instante-mas-que-ninguém-quer-que-ocorra- no-seu-dia-de-urgência...

A determinada altura confesso que fiquei um bocado confusa e atordoada ao tentar destrinçar os doentes 'reais' e os 'não-reais'... (isto apesar dos apelos insistentes à população geral para se dirigir aos centros de saúde caso necessitasse de suporte assistencial, o que não foi cumprido por muitos doentes... Ora ora, suprise surprise...)
É porque, mesmo em simulacros, não se pode descuidar os doentes reais....
Um descuido pode conduzir a uma catástrofe... Das grandes.

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